Orçamento

Governo deve perder no STF ações contra reforma da Previdência que custarão R$ 132,6 bi

BRASÍLIA – O governo federal pode enfrentar reveses no Supremo Tribunal Federal (STF) relacionados à reforma da Previdência, o que poderia resultar em uma perda fiscal de pelo menos R$ 132,6 bilhões, de acordo com uma nota técnica da Advocacia-Geral da União (AGU) obtida pelo Estadão/Broadcast.

Embora o julgamento das ações esteja suspenso desde junho devido a um pedido de vista do ministro Gilmar Mendes, já há uma maioria de dez ministros que se mostraram favoráveis à derrubada de quatro trechos da reforma. A invalidação de dois desses trechos poderá barrar a União de utilizar mecanismos que poderiam atenuar o déficit atuarial do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) em R$ 126,5 bilhões.

Além disso, a maioria dos ministros também está inclinada a invalidar uma norma que estabelece cálculos diferenciados para as alíquotas de contribuição das mulheres nos regimes geral e do serviço público, impactando o RPPS em R$ 6,1 bilhões, segundo a AGU. Até o resultado ser proclamado, os ministros ainda podem alterar seus votos.

As possíveis reviravoltas na reforma da Previdência, em vigor desde 2019, ocorrem em um cenário onde especialistas já alertam para a necessidade de endurecimento das regras devido a um déficit significativo nas contas públicas, que tende a se agravar nos próximos anos.

A previsão é de um déficit de R$ 56 bilhões no Regime Próprio dos servidores civis da União em 2025, correspondente a 0,49% do Produto Interno Bruto (PIB). Para 2026, o déficit deverá alcançar R$ 61,6 bilhões, ou 0,50% do PIB. No Regime Geral, o rombo estimado para este ano é de R$ 272,5 bilhões, ou 2,4% do PIB. Projeções indicam que, em três décadas, o déficit pode atingir até 10% da economia brasileira.

Perspectivas no STF
Aspectos do julgamento no Supremo

TemaArtigo questionadoImpacto no déficit se derrubado
(bilhões de reais)
Status do julgamento
Proibição da criação de novos RPPSArtigos 40, § 22 da CF e artigos 19, § 1º, 20, IV e 26 da EC 103/2019227,3Maioria para manter
Progressividade das alíquotas do RPPS§ 1º do art.149 da EC 103/201973,8Empatado
Contribuição extraordinária*§ 1º-B e 1º-C do art. 149 da EC 103/201971,4Maioria para derrubar
Revogação do regime de transiçãoArtigos 4º e 35º incisos III e IV da EC 103/20195…Maioria para manter
Ampliação da base de cálculo de aposentados e pensionistas*§ 1º-A do art. 149 da EC 103/20195…Maioria para derrubar
Cálculo diferenciado para mulheres no RGPS e RPPS§ 5º do art 26 da EC 103/20196,1Maioria para derrubar

A reforma da Previdência, apresentada durante o governo Jair Bolsonaro, tinha como meta inicial uma economia de R$ 1 trilhão em uma década, mas o texto aprovado em outubro de 2019 previu uma economia aproximada de R$ 800 bilhões, conforme os cálculos da equipe econômica da época.

Apesar de a reforma ser considerada insuficiente, sua totalidade ainda está em risco, especialmente diante das situações no STF. Um total de 13 ações judiciais questionam diversos aspectos da reforma, que, se aceitas, podem aumentar o déficit atuarial do RPPS em R$ 497,9 bilhões, representando um dos maiores riscos fiscais identificados no projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do próximo ano.

O montante total das ações judiciais contra a União aponta para um risco fiscal de R$ 1,170 trilhão, considerando que esse valor não inclui os R$ 126,5 bilhões referentes a dois trechos que, segundo a AGU, apenas sugerem a possibilidade de redução do déficit.

Um dos artigos que já conta com a maioria dos votos favoráveis à invalidação determina que, em caso de déficit na Previdência, a base de cálculo da contribuição de aposentados e pensionistas não pode exceder um salário mínimo. O governo estima que, com a invalidação, não poderá reduzir o déficit atuarial em R$ 55,1 bilhões.

Outro ponto que poderá ser invalidado estabelece que, se a ampliação da base de cálculo não for suficiente para equilibrar o rombo, pode-se criar uma contribuição extraordinária para inativos e servidores públicos. A perda dessa opção significa não reduzir o saldo negativo em R$ 71,4 bilhões, conforme a AGU.

Os dados foram coletados em novembro do ano passado pelo Ministério da Previdência Social e foram enviados à AGU, que atua em defesa da União no STF. A nota técnica da AGU destaca que todos os impactos das normas de cálculo e concessão de benefícios foram elaborados com base nos benefícios futuros, excluindo os já em andamento, que são considerados direitos adquiridos e, portanto, não podem ser alterados pela legislação.

A Corte já possui oito votos favoráveis à invalidação da parte da reforma que permite a contagem recíproca de aposentadorias (soma do tempo de contribuição nos regimes geral e do serviço público) sem a devida comprovação de pagamento. Essa prática era comum entre advogados que, ao ingressar na magistratura, contabilizavam o tempo de serviço anterior sem demonstrar a contribuição ao INSS. A reforma exige a comprovação da contribuição. Não há estimativas financeiras sobre o impacto nas contas públicas referentes a esse e outros pontos que a União considera impossíveis de mensurar.

Decisão de Gilmar Mendes
O julgamento no STF sobre a alíquota progressiva da contribuição previdenciária dos servidores poderá resultar em um aumento do déficit atuarial do RPPS em R$ 73,8 bilhões, conforme a nota técnica da AGU. A decisão ficará a cargo do ministro Gilmar Mendes, que terá a responsabilidade de desempatar o julgamento referente a esse trecho da reforma.

Em junho, Mendes pediu vista e suspendeu a análise, que estava empatada em 5 a 5. O questionamento das alíquotas progressivas integra um conjunto de 13 ações que discutem diversos aspectos da reforma, em vigor desde 2019, e a União estima um risco fiscal total de R$ 497,7 bilhões para todos os processos.

Embora haja uma maioria para invalidar quatro artigos, os dez votos já proferidos confirmaram a constitucionalidade da maior parte dos trechos.

Atualmente, a alíquota previdenciária dos servidores é progressiva e varia de 7,5% a 22%, em contraste com a antiga alíquota fixa de 11%. A contestação das alíquotas progressivas se fundamenta na alegação de que são confiscatórias.

O governo argumenta que a inconstitucionalidade dessas normas retornaria ao sistema anterior, gerando uma alíquota fixa de 11% para os segurados e de 22% para a União. Isso resultaria em uma redução de 20,02% no valor presente atuarial das contribuições, aumentando o déficit do Regime Próprio em R$ 73,8 bilhões.

Até o momento, votaram a favor da alíquota progressiva os ministros Luís Roberto Barroso, Cristiano Zanin, Kássio Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Luiz Fux. Os ministros Edson Fachin, Rosa Weber (já aposentada), Dias Toffoli, Cármen Lúcia e André Mendonça manifestaram-se contra. Antes do resultado ser proclamado, os votos ainda podem ser alterados. O prazo de 90 dias para que Gilmar devolva o processo para julgamento termina em meados de outubro.

Após essa devolução, cabe ao presidente do STF, Luís Roberto Barroso, definir uma data para o julgamento. Especialistas em Direito Previdenciário alertam que o retorno ao sistema anterior não resolverá os problemas do déficit fiscal.

“O servidor precisa compreender que, ao se opor ao aumento, não está retornando a um passado melhor. O déficit previdenciário continua em ascensão e essa pressão será cada vez maior”, observa o advogado Leonardo Gomes.

Título da Matéria: Governo deve perder no STF ações contra reforma da Previdência que custarão R$ 132,6 bi
Fonte: Estadão

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