Orçamento

A Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) está avaliando a criação de uma nova modalidade de plano de saúde, que abrangeria exclusivamente consultas eletivas e exames, sem incluir cobertura para internações, atendimentos de emergência e pronto-socorro. A proposta visa oferecer uma alternativa mais acessível aos consumidores, mas tem gerado controvérsias entre especialistas do setor.

Se aprovado, esse novo modelo poderia atrair cerca de 10 milhões de usuários. O projeto será submetido a uma consulta pública a partir do dia 18 de fevereiro no site da ANS, permitindo contribuições até 4 de abril. Além disso, está prevista uma audiência pública para discutir o tema no dia 25 de fevereiro.

Objetivo da proposta

A ANS argumenta que essa iniciativa busca ampliar o acesso a planos de saúde mais baratos, especialmente diante da escassez de ofertas de planos individuais e familiares. Segundo a entidade, a proposta será testada por meio de um “sandbox regulatório” – um ambiente experimental de regulação no qual as operadoras poderão comercializar esses planos sob regras específicas por um período de dois anos.

As operadoras que aderirem ao modelo deverão cumprir requisitos como:

  • Criar e registrar um novo plano coletivo por adesão;
  • Limitar a coparticipação a 30%;
  • Oferecer bônus aos beneficiários que participarem de programas de cuidado e permanecerem no plano após dois anos.

Após esse período, a ANS avaliará os resultados e decidirá se a modalidade será mantida. Caso o modelo não seja implementado permanentemente, os beneficiários poderão migrar para outros planos por meio de portabilidade extraordinária.

Repercussão no setor de saúde suplementar

A proposta tem sido bem recebida por operadoras de planos de saúde, que destacam o potencial da medida para ampliar o acesso da população à assistência médica privada. Segundo Gustavo Ribeiro, presidente da Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge), cerca de 40 milhões de brasileiros utilizam cartões de desconto em serviços de saúde, e essa nova modalidade poderia oferecer uma alternativa mais segura e regulamentada para esse público.

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) também apoia a iniciativa, argumentando que a nova modalidade pode complementar as opções já existentes no mercado sem substituir as coberturas mais amplas. Para a entidade, essa oferta ajudaria a reduzir a pressão sobre o Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo diagnósticos mais rápidos e acesso facilitado a consultas médicas.

Críticas e desafios jurídicos

Por outro lado, especialistas do setor e entidades de defesa do consumidor manifestaram preocupações sobre os impactos da proposta. O professor da Faculdade de Medicina da USP, Mário Scheffer, alerta que planos sem cobertura hospitalar podem gerar entraves no tratamento de pacientes, forçando-os a buscar assistência no SUS para procedimentos mais complexos. Além disso, o modelo pode restringir o acesso a especialidades médicas e excluir atendimentos essenciais, como terapias para transtorno do espectro autista (TEA) e emergências médicas, como Acidente Vascular Cerebral (AVC) e traumas decorrentes de acidentes.

O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) também questiona a legalidade da proposta, uma vez que a Lei 9.656/98 estabelece uma cobertura mínima obrigatória para os planos de saúde. De acordo com Lucas Andrietta, coordenador do programa de Saúde do Idec, a ANS estaria ultrapassando sua competência normativa ao tentar regulamentar um modelo que pode precarizar o atendimento e comprometer a proteção dos usuários.

Outro ponto levantado pelos críticos é o momento em que a proposta está sendo apresentada, em meio à troca de gestão na ANS, sem um debate aprofundado no Congresso Nacional. Tentativas anteriores de flexibilizar a cobertura mínima obrigatória já foram discutidas em 2016, 2017 e 2021, mas não avançaram devido a forte resistência de especialistas e órgãos reguladores.

Conclusão

A proposta da ANS levanta um importante debate sobre o acesso à saúde suplementar no Brasil. Enquanto operadoras e defensores da medida argumentam que essa modalidade pode ser uma alternativa viável para quem não consegue pagar por planos completos, especialistas alertam para possíveis impactos negativos no atendimento médico e na regulamentação do setor. O período de consulta pública e as audiências programadas serão essenciais para definir o futuro desse modelo e seu impacto na saúde da população brasileira.

Compartilhe esta notícia

Notícias recomendadas

Pular para o conteúdo