Ir para o conteúdo
Orçamento

Pela primeira vez na história, o Brasil conta com dados oficiais sobre o número de pessoas diagnosticadas com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Segundo o Censo Demográfico 2022, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 2,4 milhões de brasileiros afirmaram ter recebido diagnóstico de autismo por um profissional de saúde. Esse número representa 1,2% da população total.

Subdiagnóstico e desigualdades

Apesar do número expressivo, especialistas apontam que a prevalência real do autismo pode ser ainda maior, principalmente por conta do subdiagnóstico em regiões mais vulneráveis e do acesso desigual aos serviços de saúde especializados.

Além disso, o autismo só passou a ser formalmente reconhecido nos manuais diagnósticos internacionais nos anos 1980, o que significa que muitos adultos e idosos podem viver com a condição sem diagnóstico. Até então, o Brasil utilizava estimativas internacionais, como as do CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos), para embasar políticas públicas relacionadas ao TEA.

O que é o Transtorno do Espectro Autista (TEA)?

A definição do TEA, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), envolve déficits persistentes na comunicação social e comportamentos repetitivos e restritivos, geralmente perceptíveis desde a primeira infância, mas que podem se manifestar de forma mais evidente em fases posteriores da vida.

Perfil demográfico do diagnóstico

O levantamento mostra uma maior prevalência entre homens (1,5%) do que entre mulheres (0,9%), e uma proporção mais alta entre pessoas brancas (1,3%) em comparação com outros grupos étnicos. Especialistas avaliam que esse dado pode refletir desigualdades de acesso ao diagnóstico e ao acompanhamento especializado.

Em termos geográficos, 43% das pessoas diagnosticadas com TEA estão concentradas na Região Sudeste. Porém, os Estados com maior percentual populacional de diagnósticos são do Norte e Nordeste: Acre (1,6%), Amapá (1,5%) e Ceará (1,6%).

Inclusão no Censo e limites da metodologia

A presença do autismo no Censo só foi possível graças a uma lei de 2019, que determinou a inclusão do tema na pesquisa populacional. Entretanto, o questionário trouxe uma única pergunta sobre o tema: “Já foi diagnosticado(a) com autismo por algum profissional de saúde?”. Especialistas reconhecem que, embora esse dado seja um avanço, ele não capta toda a complexidade do espectro autista.

Desafios da educação inclusiva

Outro dado relevante revelado pelo Censo é que mais de 760 mil estudantes com 6 anos ou mais foram diagnosticados com TEA — o que representa 1,7% dos alunos no país. A maioria (66,8%) está matriculada no ensino fundamental regular, o que sinaliza avanços em termos de inclusão.

No entanto, especialistas como o professor Nassim Elias, da UFSCar, destacam que a permanência escolar ainda é um desafio. “Muitos estudantes com autismo entram na escola, mas não concluem sua formação. Isso exige investimentos em capacitação docente e apoio especializado nas escolas”, afirma o professor.

A queda no nível de instrução de adultos com autismo em relação ao restante da população também escancara as dificuldades enfrentadas por esse grupo ao longo da vida educacional.

Caminhos para o futuro: políticas públicas e formação profissional

A coordenadora do Programa do Espectro Autista do Instituto de Psiquiatria da USP, Joana Portolese, destaca que os dados do Censo devem servir como base para políticas públicas mais efetivas, especialmente no que diz respeito à formação de profissionais da saúde e da educação.

“O autismo precisa estar nas grades curriculares da medicina, psicologia, fisioterapia, pedagogia. O diagnóstico é só o início — o tratamento exige uma equipe multidisciplinar preparada”, afirma Portolese.

Conclusão

Com o levantamento inédito do Censo 2022, o Brasil dá um passo importante para compreender o cenário do autismo no país e elaborar estratégias de inclusão mais eficientes. Os dados revelam desigualdades regionais, desafios de permanência escolar e lacunas na formação profissional, mas também representam uma base concreta para avanços significativos nas políticas públicas voltadas ao TEA.

Compartilhe esta notícia

Notícias recomendadas